domingo, 27 de março de 2016

Que Deus nos dê a todos nós, a nós os bebedores, uma morte tão suave e tão bela!



“Andreas já se tinha esquecido há muito tempo do seu apelido. Agora que estava a rever os seus documentos caducados, lembrou-se que se chamava Kartak: Andreas Kartak. Era como se depois de muitos anos de tivesse descoberto a si próprio.

Ainda assim, sentia-se de certo modo irritado com o destino, por este não lhe ter enviado de novo, como da última vez, um homem gordo de bigode e com feições infantis, que lhe possibilitaria ganhar mais dinheiro. Pois não há nada a que nos possamos habituar tão facilmente como aos milagres, quando estes acontecem de uma forma sucessiva. Sim! A natureza do Homem é tal, que se este se chega a tornar mau, quando não lhe é concedido ininterruptamente tudo aquilo que um destino casual e temporário lhe pareceu prometer. São assim os Homens – e podia esperar-se outra coisa de Andreas? O resto do dia, passou-o portanto em várias tabernas. Resignou-se com o facto de o tempo dos milagres que vivera pertencer ao passado, definitivamente ao passado, e de ter regressado aos seus velhos tempos. Decidido a viver a vida de uma lenta decadência, a que os bebedores sempre se prestam – os abstémios nunca saberão o que isso é! –, Andreas dirigiu-se novamente às margens do Sena, para debaixo das pontes.”

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