terça-feira, 11 de julho de 2017

Summer reading


Li A ILHA DE ARTURO há algum tempo e o que me ficou foi uma sensação de verão doce, uma atmosfera sensual e insular. Como todos os bildungsroman, centra-se nos anos de formação Arturo na ilha mediterrânica de Prócida. Bom selvagem, Arturo cresce num mundo onírico, fascinado por um pai ausente em misteriosas viagens, paraíso do qual será expelido pelo despertar inquietante da sexualidade. Afunilando bastante, é este o enredo. Mas o que impressiona é o estilo de Elsa Morante, simultaneamente complexo e ingénuo. À semelhança de outros bildungsroman, conta-nos da perda da inocência; porém, fá-lo da forma mais inocente e cândida, recordando-nos um deus benevolente que se lançasse na narração da expulsão do Éden.

 As vozes da povoação, pouco afastada, que chegavam até mim amortecidas e brandas através     do ar calmo, pareciam-me vozes de uma raça infantil, diferente da minha; ao ouvi-las, experimentava o sentimento que experimentaria um fúnebre cavaleiro errante que, enquanto anda sozinho por bosques e vales ao cair da noite, vai ouvindo os diálogos dos pássaros reunidos sobre as árvores para dormirem todos juntos. Recordava com saudade os outros dias em que, a estas horas vadiava pelo porto, saciado do amor feito com Assuntina durante toda a tarde, e já meio ensonado; senti remorsos da pequena escrava que, hoje, me esperara inutilmente. «Neste mesmo instante – pensei –, lá em baixo, no seu casebre, ela está a preparar o jantar para os pais que voltam dos campos. Na “casa dos guaglioni”, a minha madrasta canta, sentada ao pé da alcofa, para adormecer Carmine. Carmine não tem, contudo, sono e ainda quer brincar… Toda a gente se ocupa de coisas simples e naturais. Só eu persigo mistérios terríveis e extraordinários que talvez nem sequer existam e que, além disso, não tenho interesse em conhecer.»

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