Saibas, amado filho, que, se te encantes de alguém, não deves ceder indiscriminadamente ao prazer, estejas tu bêbedo ou sóbrio, porque é sabido que o sêmen que de ti irrompe é sempre germe de almas e pessoas. Não te entregues ao prazer inebriado de vinho, é coisa danosa e deletéria; melhor esperar, ao menos, que os efeitos do álcool passem. E não deixes que o prazer comande sempre que fiques excitado, pois esse é um comportamento verdadeiramente animalesco, e os animais não conhecem nem tempo nem lugar. Os homens, ao contrário, devem sempre saber o momento justo, diferenciando-se assim das feras.
Em relação à escolha entre garotos e mulheres, não limites tua preferência a um único gênero, garotos ou mulheres, para que tu possas obter prazer de ambos os sexos, evitando assim a inimizade de um ou de outro.
Os excessos, como te disse, são danosos, mas, saibas que a abstinência também tem seus perigos. Qualquer coisa que faças deve ser feita de acordo com teu desejo e não por obrigação, de modo que o dano seja menor.
Havendo desejo ou não, é todavia aconselhável que te controles durante o grande calor e o grande frio. É nas duas estações extremas que as paixões produzem os efeitos mais deletérios, principalmente para os mais velhos. De todos os momentos do ano, ao invés, é a primavera, com seu clima temperado e suas fontes túrgidas, a estação mais propícia, onde a face do mundo se mostra feliz e faceira. E assim como o macrocosmo, graças à primavera rejuvenesce nosso corpo, que é o microcosmo. Os humores do corpo tornam-se temperados e o sangue de nossas veias se dilatam, assim como o sêmen nos lombos. Mesmo sem uma vontade precisa, irresistível se torna a busca por prazeres e incontrolável a necessidade de regozijos e encontros, mas se autêntico é o ardor, menor é o dano.
E assim a vida segue. Se possível não dês vazão a teus líquidos vitais no calor tórrido e no inverno rígido, e caso percebas um aumento do ardor procura reestabelecer o equilíbrio com uma dieta harmoniosa. Durante o verão dá predileção aos garotos, e reserva o inverno às mulheres, respeitando sempre um sano equilíbrio sazonal. E, se neste discurso fui breve, é porque mais não serve.
Kay Ka’us ibn Iskandar (Qābūs-nāme, séc.XI)
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