"Pareceu pouco depois que ele recuava e alterava as suas carícias. Leda abria-se à sua frente como uma flor azul do rio. Sentia entre os joelhos frios o calor do corpo da ave. De repente gritou: Ah!… Ah!… E os seus braços tremeram como ramos claros. O bico tinha-a horrivelmente penetrado, e a cabeça do Cisne movia-se dentro dela com raiva, como se estivesse a comer-lhe as entranhas, deliciosamente.
Houve então um longo soluço de felicidade abundante. Deixou cair para trás a cabeça febril com os olhos fechados, com os dedos arrancou erva e crispou no vazio os pequenos pés convulsivos que desabrocharam no silêncio.
(...)
— És a noite. Amaste o símbolo de tudo quanto é luz e glória, e uniste-te a ele.
«Do símbolo nasceu o símbolo, e do símbolo nascerá a Beleza. Ela está no ovo azul que saiu de ti. Sabe-se desde o começo do mundo que vai chamar-se Helena, e o último dos homens saberá que ela existiu.
«Estiveste cheia de amor porque tudo ignoraste. Em louvor das bem-aventuradas trevas.
(...)
— Não ouviste as palavras do Rio? Nunca devemos explicar os símbolos. Nunca devemos penetrá-los. Tende confiança. Ah! Não duvideis. O que figurou o símbolo escondeu nele uma verdade, mas não deve manifestá-la; se o fizesse, que razão teria para a simbolizar?
«Não devemos dilacerar as Formas porque só escondem o Invisível. Sabemos que estas árvores têm encerradas dentro de si adoráveis ninfas; e, no entanto, quando o lenhador as abre já a hamadríade está morta. Embora saibamos que atrás de nós há sátiros dançantes e nudezes divinas, não devemos voltar-nos: tudo teria desaparecido.
«O reflexo ondulante das fontes é que é a verdade da náiade. O bode de pé no meio das cabras é a verdade do sátiro. Uma outra de vós é a verdade de Afrodite. Mas não devemos dizê-lo, não devemos sabê-lo, não devemos tentar aprendê-lo. Essa é a condição do amor e da alegria. Em louvor das bem-aventuradas trevas.»
Pierre Louÿs
Tradução de Aníbal Fernandes