De repente ele notou – e era como
se fosse pela primeira vez – quanto o céu ficava longe.
Foi como um sobressalto. Exactamente
por cima dele reluzia entre as nuvens uma nesga de azul, indizivelmente
profunda.
(…)
– O infinito! – Törless conhecia o
termo das aulas de matemática. Jamais imaginara algo de especial a esse
respeito. O termo voltava sempre: algo que alguém um dia inventara e desde
então fora possível fazer cálculos com ele, tão precisamente como com qualquer
coisa sólida. Era exactamente o que valia no cálculo; e Törless jamais fizera
alguma tentativa de entendê-lo para além disso.
Agora, porém, varava-o como um raio
a compreensão de que essa palavra continha algo terrivelmente inquietante.
Parecia-lhe um conceito domesticado, com que fizera diariamente pequenas artes,
mas que de repente se libertara. Algo que ultrapassava o entendimento, algo
selvagem, aniquilador, adormecido pelo trabalho de algum inventor e que de
repente despertara e se tornara novamente terrível. Ali, naquele céu, isso
achava-se agora por cima dele, vivo e ameaçador, zombando sinistramente dele.
(…)
Törless ficou dominado pelo anseio
louco de ver duplamente todas as coisas, pessoas e factos. Como se se
prendesse, de um lado, à palavra inocente e esclarecedora fornecida por um
inventor qualquer; e do outro lado, fossem muito estranhas, ameaçando
libertar-se a qualquer momento.
(…)
A matemática deve estar certa; mas
o que há com a minha cabeça e tudo o resto? Os outros não sentem isso? Como é
que essas coisas acontecem dentro deles? Não acontece nada?
Os
chamados romances de formação encontram sempre um eco interior em mim. Às vezes,
penso que tive uma adolescência demasiado saudável, sob o signo do riso e do
haxixe. As angústias existenciais que então me faltaram, sobram hoje. E são
poucos os adultos disponíveis para pensar o sentido da vida, ou das palavras, tão somente. Marchar, marchar sempre! Talvez por isso, fosse o narrador um pouquinho menos interventivo e «sábio», e acho que
teria gostado mais deste romance.
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