domingo, 30 de junho de 2013

Guia de Amor para Infiéis


“Não sou má pessoa. Eu sei que isto soa defensivo, pouco escrupuloso, mas é verdade. Sou como toda a gente: fraco, cheio de falhas, mas basicamente bom. A Magdalena, porém, não tem a mesma opinião. Acha que eu sou um dominicano típico: um sucio, um cabrão.”

“Levas o máximo tempo que podes a desligar o carro. Sentes-te esmagado por uma tristeza pelágica. Tristeza por teres sido apanhado e pela incontroversa certeza de que ela jamais te perdoará. Olhas para as suas pernas incríveis e para o seu entrepernas, para essa ainda mais incrível pópola que amaste de forma tão inconstante nos últimos oito meses. Só quando ela avança furiosa na tua direcção é que tu sais finalmente do carro. Atravessas descontraidamente o relvado, propulsionado pelo derradeiro gás da tua revoltante sinvergüenceria. Hey, muñeca, dizes, prevaricando até ao fim. […] Em vez de baixares a cabeça e aguentares como um homem, pegas no diário com a ponta dos dedos, como se fosse uma fralda de bebé recém-cagada, como se fosse um preservativo recém-usado. Passas os olhos pelos excertos acusadores. Depois olhas para ela e sorris um sorriso que o teu rosto hipócrita irá recordar até ao fim dos teus dias. Querida, dizes, isto é apenas um capítulo do meu romance.
É assim que a perdes.”

“A nossa relação não era para ser nada de sério. Não nos vejo casados ou algo do género, e tu acenaste com a cabeça e disseste que compreendias. Depois fodemos, para podermos fingir que nada de doloroso se tinha passado. Devia ser talvez a quinta vez que estávamos juntos e depois de pores um vestido preto e justo e calçares as sandálias mexicanas, disseste-me que podia telefonar-te quando quisesse, mas que tu nunca me telefonarias. Tu é que tens de decidir onde e quando, disseste. Se ficasse ao meu critério, disseste, ia querer ver-te todos os dias. […] Tu não queres desistir, mas também não queres sair disto magoada. Não estamos no melhor dos barcos, mas que queres que te diga? […] És a única pessoa que conheço que consegue passar tanto tempo como eu numa livraria. Uma espertinha: algo que não se encontra facilmente.”

“E porque o amor, o verdadeiro amor, não é coisa que se esqueça facilmente. […] A princípio, fazes de conta que não te importas. Seja como for, tens muitas razões de queixa em relação a ela. Tens sim! Não sabia fazer broches, tinha na cara uma penugem detestável, nunca rapava os pelos púbicos, não limpava o apartamento, etc. […] Tão depressa estás a ponto de te meter no carro para ir a casa dela, como logo no minuto seguinte estás a telefonar a uma sucia e a dizer-lhe: És a mulher dos meus sonhos.”

“E, por fim, quando te julgas capaz de o fazer sem te desintegrares numa combustão de átomos, abres uma pasta que mantiveste escondida sob a cama. O Livro do Juízo Final. Cópias de todos os e-mails e fotos dos teus tempos de infiel, aquelas que a ex descobriu e compilou e te enviou por correio um mês depois do fim. Querido Yunior, material para o teu próximo livro. Deve ter sido a última vez que ela escreveu o teu nome.
Lês aquilo tudo da capa à contracapa (sim, ela mandou encapar). Com surpresa, verificas que és um cobarde e um cagarolas do caralho. Custa admitir, mas é um facto.”


É assim que a perdes de Junot Díaz. Vale muito a pena ler: pelo tom coloquial e honesto até ao osso como narra a masculinidade. Um homem está obrigado a ser um homem: aí começa a genealogia dos cabrões. É bom conhecer-lhes os corações frágeis, obrigados à dureza, raramente expostos.

quinta-feira, 20 de junho de 2013

O Jogo Sério ou a pantomina do amor


O Doutor Glas deixou-me muito curiosa sobre a obra de Hjalmar Söderberg, pelo que fiquei muito alegre quando soube na Feira do Livro que a Relógio d’Água tinha acabado de publicar outro livro do autor. O Jogo Sério é, nas palavras de Henning Mankel, “uma história de amor que não envelhece. Mantém-se tocante, evocativa e vívida”. A história de Arvid e Lydia insere-se numa tradição comum daquilo que se chama a novela do adultério. Mas mais uma vez, temos de olhar para além das aparências em Söderberg. Ao contrário de Madame Bovary ou Anna Karenina, aqui ninguém morre por amor. A visão deste amor extraconjugal – o mais apto à codificação romântico porque externo ao contrato racional do casamento – não conserva qualquer vestígio de tragédia.

Arvid e Lydia nunca se comprometem de facto um com o outro. O jogo sério que ambos jogam é o da pantomina do amor, nenhum representando de forma exemplar. Tudo é banal e todos enganam todos. “Enquanto se beijavam, ele pensou: isto é apenas um gesto de cortesia exigido pela situação.” Quando a mulher de Arvid lhe pergunta se ele ouviu dizer alguma coisa, é impossível não suspeitar dela também. Tem razão a figura do escritor Rissler quando afirma que uma personagem construída a partir de Lydia é artificial. Neste jogo sério todos são artificiais, embora insistam em mimetizar o humano.

Hjalmar Söderberg é talvez um autor que, à falta de um melhor termo, se poderia chamar pós-moderno. Não na forma obviamente, pois a sua prosa conserva a elegância e coerência narrativa do século XIX, mas na solução pós-romântica que as suas histórias encontram. O Jogo Sério e O Doutor Glas partilham o mesmo problema moral. A razão moderna fez da moral uma forma opaca que paradoxalmente se opõe à concretização desse mesmo projecto racionalista. Morto Deus, tudo se torna inevitavelmente permitido. Disso se dava conta Dostoievski através de Raskolnikov e do seu crime, embora o seu espírito ainda fosse refém de uma certa beatitude sagrada que impunha o castigo e a redenção. 

Em O Doutor Glas, Söderberg repete a questão da relação entre ateísmo e crime, tendo a coragem necessária de afastar a assombração divina da equação. O que resulta num problema ainda mais bicudo: eliminada a autoridade da lei e a sua concomitante produção de culpa, os modernos estão entregues a um tédio sem resolução. A moral torna-se um termo formal, cuja maioria reconhece na sua arbitrariedade, e a vida parece não encontrar outro destino para além da bestialidade infeliz. A primeira coisa que fizera ao mudar-se para aquele quarto fora tirar todas as horrendas pinturas da senhoria. Não tinha nenhumas com que as substituir; enquanto as retirava, ocorrera-lhe, com um sorriso, quão típica era esta atitude – nada mais fácil do que deitar abaixo as coisas, mas voltar a levantá-las era outra história.”

Crime e amor são reversos do mesmo problema íntimo de uma subjectividade que ao perder o Outro fica encerrada numa solidão sem recursos. O que me recorda recentes palavras de alguém: “tu jogas bem sem bola”. É fácil para quem fez do amor uma aposta e perdeu.

“Ela deve estar agora a percorrer Djurgarden para ir ao encontro dele. O Sol brilha. Ela pára numa curva do caminho e diz-lhe, de olhos baixos sob as longas pestanas: «Há uns dias encontrei um homem que amei em tempos. Não compreendo como é que alguma vez o pude ter amado.»

…E o comboio continuou a rolar…”

terça-feira, 4 de junho de 2013

to shake a memory



Working through das pain



Last night I swear I felt your touch

Gentle and warm

The hair stood on my arms

How, how, how?



Show me the way, show me the way, show me the way

To shake a memory



I flipped my forelock, I twitched my withers, I reared and bucked

I could not put my rider aground

All these fine memories are fuckin' me down



I dreamed it was a dream that you were gone

I woke up feeling so ripped by reality

Love is the king of the beasts

And when it gets hungry it must kill to eat

Love is the king of the beasts

A lion walking down city streets

I fell back asleep some time later on

And I dreamed the perfect song

It held all the answers, like hands laid on



I woke halfway and scribbled it down

And in the morning what I wrote I read

It was hard to read at first but here's what it said


Eid ma clack shaw

Zupoven del ba

Mertepy ven seinur

Cofally ragdah


Show me the way, show me the way, show me the way

To shake a memory