sábado, 4 de março de 2017

O mundo de ontem



Tudo começa quando o Grande Xá da Pérsia é tomado por uma grande inquietação, perde o interesse nas suas mulheres e decide viajar até ao Ocidente, esperançado no alento que as artes eróticas do Ocidente lhe poderão proporcionar. Viena no final do século XIX – que outro local pode personificar melhor o final de uma visão do mundo, de uma Europa e de uma época? A milésima segunda noite é a noite do logro e da decepção com os devaneios das mil e uma noites.

– Porque lamentas por nós, Pantominos? – perguntou o Xá.
– Por muitas razões – respondeu o eunuco – mas principalmente porque os homens estão sujeitos ao princípio da mudança. Trata-se de um princípio falacioso, porque, na verdade, não há mudança nenhuma.
– Estás a querer dizer que devo viajar para algum sítio só para sentir essa mudança?
– Sim, Senhor – disse Pantominos – para se convencer de que afinal não há mudança nenhuma.
– E isso só por si iria curar-me?
– Não o iria convencer – disse o eunuco – mas iria proporcionar-lhe as experiências necessárias para chegar a essa mesma convicção.
– Como chegas a essas conclusões, Pantominos?
– Porque fui castrado, Senhor! – retorquiu o eunuco e curvou-se de novo.

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