Frequentei
a Zona desde os primeiros dias… Lembro-me de termos parado numa aldeia e o que
mais me impressionou foi o silêncio. Nenhum passado, nada… Percorremos a rua…
Silêncio. Bem, as casas ficaram vazias, não havia lá gente, foram-se todos
embora, mas o silêncio era total, sem um único pássaro. Pela primeira vez vi
uma terra sem pássaros… Sem mosquitos… Nada voava…
Desde que apanhei um documentário na RTP2 sobre a vida animal
em Chernobyl, que o lugar me fascina. VOZES DE CHERNOBYL, de Svetlana
Alexievich veio exponenciar ainda mais esse fascínio. Tento decompô-lo em
partes: por um lado, uma catástrofe inédita e uma cidade abandonanda, evacuada,
que a natureza vai reconquistando, numa fosforescência incrível que não deixa
adivinhar a radioactividade. Em Chernobyl tudo parece ter permanecido como
estava naquele dia fatídico de 26 de Abril de 1986. Aos habitantes, foi dito
que regressariam após três dias. Depois, há a semelhança profética entre a Zona
e o Stalker de Tarkovsky, realizado sete anos antes! E por último, as histórias
daquele povo, o povo soviético, o mais literários dos povos, como já vinha
intuído e estas histórias reais confirmaram, histórias cheias de dever e amor,
como nos livros de Dostoievski e Tchékhov. Que outro povo se poderia por a
enterrar a própria terra?! Foi uma leitura duríssima mas fiquei absolutamente
rendida ao talento de Alexievich: o melhor prémio Nobel que li nos últimos anos
e, sem dúvida, um dos melhores livros que li este ano.
Completei a leitura com um documentário que saquei quase
aleatoriamente – As babuchkas de Chernobyl – sobre umas quantas velhotas que
regressaram à Zona para terminar os seus dias, todas desempenadas, a beber
vodka e a rir sem dentes.
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