“Ambos os panoramas me
pertenciam, achava eu, e esta impressão de dupla posse dava-me uma sensação
embriagante de universalidade, como se, para onde quer que olhasse, me fosse
dado ver uma faceta de mim mesmo – uma ilusão malsã, vim depois a descobrir, já
que mais tarde me fez crer que só valia a pena visitar um país ou uma cidade se
lá adquirisse uma casa ou se escrevesse um livro acerca desse lugar. Como todas
as fantasias napoleónicas, era também um sentimento de solidão. Se tudo me
pertencia, então eu próprio não pertencia a nenhum recanto especial do mundo. As
pessoas que avistava do cume do meu monte, a lavrarem os seus campos, a
cuidarem das suas lojas e oficinas, a namoriscarem enquanto gozavam as suas
férias à beira-mar, habitavam um mundo diferente do meu. Elas estavam todas
juntas, eu estava completamente só. Elas faziam parte de uma irmandade, eu era
um estranho. Elas falavam umas com as outras num idioma que todas entendiam,
acerca de temas que a todas interessavam. Eu falava numa língua que era só
minha e alimentava pensamentos que as encheriam de tédio (…).
Três grandes castanheiros
cresciam num recanto, e eu costumava deitar-me ali, oculto na erva alta e
húmida entre eles, no silêncio denso e de aroma adocicado das tardes estivais
de Oxford. Rãs saltavam em volta de mim, distraindo-me; gafanhotos moviam-se
nas ervas, a um palmo dos meus olhos; os sinos de Oxford dobravam, lânguidos,
marcando a hora certa; quando ouvia alguém a chamar-me –«Morris! Morris! És tu
a lançar! – sabia que, fosse lá quem fosse, não se ia dar ao trabalho de
procurar muito. Marvell achava que o Jardim do Éden era certamente melhor
quando Adão ali deambulou sozinho, e toda a minha vida senti em certos lugares,
tanto em zonas rurais como em cidades, uma aura que me parece verdadeiramente
sexual, mais pura mas não menos excitante do que a sexualidade do corpo. A origem
desta emoção perversa mas oportuna parece-me residir naquelas tardes perfumadas
de críquete, já tão distantes.
Numes
sedentos da mortal beleza
Verde arvoredo tomam como presa,
E Pã quis Siringe com amor fatal,
Não como ninfa, como caniçal.”
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